03 abril, 2012

Helena

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Helena estava sentada na poltrona à frente da janela, com os braços em torno dos joelhos, quando acordei. Ela observava o trânsito com repúdio, como quem se condena eternamente pelo cigarro que está tragando. De maquiagem borrada e vestindo somente um roupão, as lágrimas escorriam pelo rosto e tocavam sutilmente o parapeito da janela. Helena tinha tanto a esconder; e muito mais pra esquecer. Precisava de uma bússola, de alguém em quem confiar, de uma rocha que fosse base sólida pra construir uma vida. E o pior de tudo é que eu sabia que não era aquilo que ela enxergava em mim - não mais. Saída de um conto de fadas, aquela eterna menina sabia como fazer sentir-me culpado pelos erros do passado. Ligações nunca retornadas e noites em que a ignorei. Agora ela anda por aí, com 24 anos nas costas, amargura no olhar e o all star sempre desamarrado. Eu congelava por dentro toda vez que ela entornava uma dose de tequila. Sei que o cabelo colorido foi fruto da vez em que disse que não a amava tanto assim. Também sei que quando ela pichou a parede do quarto, queria mesmo era bater com a lata de spray na minha cabeça e chorar até desidratar. 
Helena costumava ser sorridente, ter brilho próprio, ser alguém na vida. Ontem à noite ela sussurrou em meu ouvido que preferia estar morta. Se eu somente conseguisse voltar no tempo e consertar tudo aquilo...eu nunca quis ser o vilão da peça da vida dela. Se ao menos tivesse pensado antes de proferir certas palavras, beijar outras garotas e desvalorizá-la, creio que a melancolia e a angústia não fossem minhas companheiras. Você sabe o que é o pior? É saber que ela sempre esteve lá por mim. Lembro do dia em que choveu por três dias consecutivos em Porto Alegre, fiquei doente e ela ficou na minha casa, com a delicadeza que suas mãos e suas palavras costumavam ter, até eu melhorar. Eu tomei o direito ao riso de Helena. Acho que ela percebeu que eu estou acordado; consigo ver o desprezo no seu olhar - o mesmo de quando eu saí com a Paola, há uns dois anos atrás. Nossa relação nunca foi selada por status de relacionamento; ela era selada por pacto de sangue. E eu a fiz derramar o seu - aos 19, dava pra perceber os cortes em seus pulsos enquanto ela segurava a câmera nas pequenas mãos. Helena completou 18 anos e o inferno de sua vida apareceu pra ela - eu mesmo. Roubei uma vida inteira dela, enquanto poderia estar fazendo-a feliz - é uma pena que eu só perceba isso agora, pois Helena acabou de partir.

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